19 de abril de 2013

The Walls Of This Room…


Se perguntarem por mim diz-lhes que Enlouqueci...

Bocas OnLine

18 de abril de 2013

Não Se Morre Apenas De Falta De Correspondência...

É preciso que saibam: este rosto
não está à venda. Há quarenta
e cinco anos que o trago apenas
para dar e receber o espanto
do amor e do tempo, do eco e da rosa
e a violenta companhia
insubstituível do mundo.

Os amigos mortos e sepultados
sob este sorriso, também não estão
à venda – é com eles que entro
na força dos versos em que falo
de nós todos. Estes olhos
já leram Platão (entre outros)
já viram chegar a noite
nas grandes cidades, corpos proibidos
homens e mulheres sem paixão
moribundos face a face com o absurdo
de um tempo já maior de quanto há neles

e casais cumpridores que não gastaram nunca
um tostão de amor a mais.

Já todos dormimos em má companhia
(mesmo se nos limitamos a dormir
inteiramente sós – e até por isso)

Meus prósperos e
devotos irmãos atarefados, deixai-me
em paz. Ou então dêem-me um pouco
de tabaco ou mandem-me
de férias um postal (mesmo
que morra). Um póstumo
postal. E sem remorso.
Já que não se morre apenas
de falta de correspondência...

Victor Matos E Sá

Bocas OnLine

17 de abril de 2013

Viro-Me Para A Terra Alegre Dos Sonhos


Uma noite, esquecido de tudo, pusera-se a observar o trabalho de tantos anos, e sentira uma espécie de náusea e de tédio.
Arrumara as telas e metera o resto do material numa grande caixa em cartão, resolvendo que não lhes tocaria mais; e fora nessa noite que descobrira que nunca se regressa ao que se abandonou.
No entanto, apesar da decisão tomada, um último compromisso com a galeria - uma performance - tinha de ser cumprido. Assim, dois meses mais tarde, na data prevista, Beno entrou na galeria como um sonâmbulo.
Sentia-se febril e tinha o rosto lívido, dessa lividez quase transparente e leitosa que só os mortos adquirem. E relembrou qualquer coisa que lera, havia muito tempo, num livro emprestado: É assim que um dia dizemos adeus, de muito longe, a alguém que nós fomos.

Al Berto

Bocas OnLine

If



Bocas OnLine

14 de abril de 2013

13 de abril de 2013

Um Silêncio Perfeito...

E sobretudo olhar com incidência. Como se nada se passasse, o que é certo. Mas a ti quero olhar-te até estares longe do meu medo, como um pássaro no limite afiado da noite. Como uma menina de giz cor-de-rosa num muro muito velho subitamente esbatido pela chuva. Como quando se abre uma flor e se revela o coração que não tem. Todos os gestos do meu corpo e voz para fazer de mim a oferenda, o ramo que o vento abandona no umbral. Cobre a memória da tua cara com a máscara daquela que serás e afugenta a menina que foste. A nossa noite dispersou-se com a neblina. É a estação dos alimentos fritos. E a sede, a minha memória é de sede, eu em baixo, no fundo, no poço, bebia, recordo.
Cair como um animal ferido no lugar de hipotéticas revelações. Como quem não quer a coisa. Nenhuma coisa. Boca cosida. Pálpebras cosidas. Esqueci-me. Dentro o vento. Tudo fechado e o vento dentro. Sob o negro sol do silêncio douravam-se as palavras.
Mas o silêncio é certo. Por isso escrevo. Estou só e escrevo. Não, não estou só. Ha alguém aqui que treme. Ainda que diga sol e lua e estrelas refiro-me a coisas que me acontecem. E o que desejava eu? Desejava um silêncio perfeito. Por isso falo. A noite parece um grito de lobo. Delícia de perder-se na imagem pressentida. Levantei-me do meu cadáver, fui à procura de quem sou. Peregrina, avancei em direcção àquela que dorme num país ao vento. A minha queda sem fim na minha queda sem fim onde ninguém me esperava pois ao descobrir quem me esperava outra não vi senão a mim mesma. Algo cai no silêncio. A minha palavra foi eu embora me referisse à aurora luminosa. Flores amarelas constelam um círculo de terra azul. A água treme cheia de vento. Deslumbramento do dia, pássaros na manhã. Uma mão desata as trevas, arasta a cabeleira da afogada que não cessa de passar pelo espelho. Volto à memória do corpo, hei-de regressar aos meus ossos de luto, hei-de compreender o que a minha voz diz.

Alejandra Pizarnik

Bocas OnLine

8 de abril de 2013

Common Burn



Bocas OnLine

Começa O Tempo Onde A Boca Se Desfaz Na Lua

Nem sempre me incendeiam o acordar das ervas e a estrela despenhada de sua órbita viva.

- Porém, tu sempre me incendeias.

Herberto Helder

Bocas OnLine

7 de abril de 2013

My Love



Bocas OnLine

Bom Dia...Tristeza

Julgava que te tinha dito adeus,
um adeus contundente, ao deitar-me,
quando pude por fim fechar os olhos,
esquecer-me de ti, dessas argúcias,
dessa tua insistência, teu mau génio,
tua capacidade de anular-me.
Julgava que te tinha dito adeus
de todo e para sempre, mas acordo,
encontro-te de novo junto a mim,
dentro de mim, rodeias-me, a meu lado,
invades-me, afogas-me, diante
dos meus olhos, em frente à minha vida,
por sob a minha sombra, nas entranhas,
em cada golpe do meu sangue, entras
por meu nariz quando respiro, vês
pelas minhas pupilas, lanças fogo
nas palavras que minha boca diz.
E agora que faço? Como posso
desterrar-te de mim ou adaptar-me
a conviver contigo? Principie-se
por demonstrar maneiras impecáveis.
Bom dia, tristeza.

Amália Bautista

Bocas OnLine